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Safari fotográfico ferroviário

por em 13/Apr/2008, sobre relatos

Tendo desencontrado do sr. Ângelo para uma caminhada em trilhas desconhecidas na Serra de… bem, você já sabe onde, resolvi dar cabo desta situação. Eu tinha que conhecer aquela ferrovia abandonada, seus túneis e perigos. E, claro, fazer fotos de lindos leviatãs de ferro (ok, Latuff, essa fala é sua).

Cheguei tarde lá, e entrei na mata por volta das 7h. Tinha que dar a volta, driblando portarias e cabines de vigia com seguranças que fazem de tudo para impedir o acesso à serra. Primeiro, por parte da administração de Paranapiacaba, para que não mais entrem na mata os farofeiros que a devastaram em passado recente; e segundo, da MRS, que já teve muita dor-de-cabeça com imbecis andando nos trilhos dos trens e sofrendo acidentes fatais. Não posso culpar os dois lados pelas restrições, mas ao mesmo tempo não vou limitar a minha aventura a um passeio de vovó com um guia tolo.

Tendo dado a volta e estando a uma distância segura dos vigias, posso iniciar o passeio. Encontro uma picada de asfalto para pessoas, não mais que meio metro de largura, logo à esquerda da ferrovia. É uma trilha muito bonita, permite fotografar as duas ferrovias e é um ótimo lugar para acampar com uma barraca pequena. A viagem segue bem, em alguns momentos até achei fácil demais. Se fosse daquele jeito até Cubatão seria perfeito. Mas nem tudo é perfeito.

A trilhinha que eu seguia foi se tornando fechada, e em alguns momentos bastante difícil. Num ponto mais alto, tive que tomar cuidado para não sair rolando morro abaixo. E logo mais à frente, ela passou a não existir mais, pois a serra se tornou um pouco mais plana. Começo a caminhar pela ferrovia abandonada. O lugar está tão largado que o mato cresceu em volta dos trilhos e tudo o que sobrou foi uma pequena trilha entre eles. Os únicos lugares em que ainda dá para vê-los na íntegra é dentro dos túneis, onde quase não cresce nada por falta de sol. Achei muito triste como um esforço tão grande em ter criado aquela ferrovia, bem como seu valor histórico, foram jogados ao descaso. Mais uma vez: uma trilha linda de ser trilhada, simplesmente trancada a bala a visitação e jogada ao vento.

Pude ver construções abandonadas que deviam ser esplêndidas em suas épocas. O sistema funicular é algo muito interessante e esta ferrovia é ponto-chave no crescimento de São Paulo e do Brasil na época cafeeira. Esse é um passeio de aventura pelo estado atual das coisas, mas bem que eu gostaria mais que fosse um passeio histórico de vovó. Nosso país é muito novo e por isso ainda não temos uma cultura de preservação de nossa história. Só daqui muito tempo iremos aprender com nossos erros.

Enfim, com a mata fechando cada vez mais, tenho que sacar o facão para abrir a trilha. Em determinados momentos nem mais é possível determinar se estou no caminho certo ou não; o mato cresceu tanto que cobriu os trilhos e somente vez ou outra vejo um poste em meio a árvores que crescem, ou dou a sorte de encontrar uma ponte.

As pontes são um caso à parte, dou a sorte de estar vivo para contar essa história. Estão num estado de podridão tão grande, que o parco caminho para pedestres simplesmente não existe mais. Lembra-se da ponte do Indiana Jones? As de lá, acredite, são piores. Tive que caminhar cuidadosamente sobre os trilhos corretos (alguma seções já apodreceram por completo), que, em alguns momentos, nem tem mais o dormente embaixo. A altura dessas pontes varia ente 30 e 100 metros. Andar olhando para os trilhos e ver o deslocamento da mata abaixo em velocidade diferente causa tontura, e requer uma pausa a cada poucos metros. Imagine-se estar de pé em dois trilhos podres a 100 metros de altura, sem nenhum lugar para se agarrar caso aquilo desmorone sobre a mata, e você terá uma idéia do que é estar lá. Tive que atravessar umas quatro pontes dessas.

O mato cresce, e esse em sua grande maioria é composto de uma maldita espinheira que não se corta com meu facão (novinho, iniciei seu uso nesta jornada). Meu braço está vermelho e todo arranhado. Suor me escorre às bicas. Avanço muito lentamente. Em determinado momento, o mato está tão alto e tão impenetrável que preciso refletir sobre a continuidade. O GPS me diz que ainda é metade do caminho à Cubatão e o relógio aponta 13h. Finalmente chego a um ponto em que o mato me vence. Volto com uma dor no coração de não chegar a meu destino e de ver um lugar tão espetacular nesse estado deprimente. Por fora, sujo, rasgado, cansado, dolorido, queimado de sol, machucado, arranhado, mas por dentro novo. Novo por ter habitado no mundo real um lugar que habita os meus sonhos.

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